Para cuidar dele e cultivá-lo. O trabalho é dom de Deus, não um castigo pelo pecado. Mesmo anterior à queda, a humanidade tem deveres a cumprir. Em outros lugares no Pentateuco, esta expressão descreve somente a atividade dos sacerdotes. O último termo inclui guardar o jardim, talvez referindo a usurpação de Satanás (ver 3.1-5). No entanto isso fica melhor entendido se como sacerdotes e guardiães do jardim, Adão e Eva deveriam ter expulsado a serpente; em vez disso, ela os expulsa.
Deus desejava que o ’ãdãm cultivasse a terra ( ’ãbad-, veja o mesmo verbo em 2.5); podemos até mesmo traduzir o termo como “servir”. A história estabelece uma clara relação entre essa vocação humana e o v. 5 de Gn 2; o 'ãdãm deveria envolver-se com o trabalho que Deus já havia iniciado. O Senhor plantou o jardim, e o ’ãdãm deveria mantê-lo produtivo.
Simão, o Novo Teólogo, comenta Gênesis 2.15:
No início, o homem foi criado com um a natureza propícia ao trabalho, pois, no paraíso, Adão deveria arar e cu id ar da terra; há em nós uma inclinação natural ao trabalho, com o algo bom. Aqueles, ainda que espirituais e santos, que se rendem ao marasmo e apatia acabam sujeitando-se às paixões (Louth, 2001, p. 61).
Dignidade e Trabalho no Jardim
Nesse caso, levar Deus a sério como Criador do ser humano significa reconhecer que Deus tem a ver também com o espaço vital, o alimento, o trabalho e a comunidade. O que nós imaginamos ser o “paraíso” não aparece na história bíblica da criação. Pelo contrário, Deus coloca o ser humano que ele havia criado no jardim “para cultivá-lo e preservá-lo”; é terra que necessita ser cultivada e preservada. Com a criação, o ser humano é incumbido de uma tarefa.
Deus confia a terra ao ser humano e, desse modo, confia que ele seja capaz de dar conta da tarefa. Uma vida humana sem essa incumbência que confia em sua capacidade não seria existência humana plena. O trabalho do ser humano adquire aqui um sentido que não lhe precisa ser conferido pelo ser humano. Ele já recebeu do seu Criador esse encargo.
A palavra para “cultivar” corresponde ao termo latino “colere”, que se referem originalmente à agricultura. Porém ele diz respeito a todo “elaborar/ processar”, a todo trabalho humano. Todo ato humano de criar é entendido aqui como criação cultural {colere), não havendo diferenciação entre trabalho braçal e intelectual, nem maior valorização do trabalho intelectual frente ao trabalho braçal.
O par de palavras “cultivar e preservar” expressa que cultivar sem preservar não corresponde ao encargo que o ser humano recebe aqui do seu Criador. Predar e espoliar a terra e suas energias equivalem a desprezar o encargo recebido do Criador e necessariamente acabarão por ter um efeito prejudicial para o ser humano. Quando polui e contamina a terra que lhe foi confiada, o ser humano destrói o espaço vital que Deus lhe confiou para preservação.