1 Livro da genealogia de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão.

As Genealogias: Mt 1.1-17; Lc 3.23-38; Jo 1.1-14

Foi lá em Cesaréia de Filipe que Jesus quis saber quem Ele era na ótica do povo e de seus discípulos (Mc 8.27-29). Ora, não se pode responder essa pergunta sem que a outra também não seja respondia - aquela que já circulava simultaneamente nos bastidores dos Escribas e Fariseus. Estes, a usavam para colocar dúvidas sobre a pessoa de Jesus nos corações das multidões: "sabemos que Deus falou a Moisés, mas esse (Jesus) não sabemos de onde ele vem" (Jo 9.29 conf Mc 6.2)

<p>A dupla questão levantada no início da vida de Jesus, são respondidas nos quatro Evangelhos, e todas as respostas tem por base na genealogia de jesus descrita em Mateus, Lucas e João. Eu não enganei, de um certo modo João também apresenta uma como veremos adiante.

Quem era Jesus? não se limitava a ser filho de um carpinteiro (Mc 6.3) e De onde Ele vem? não se limitava ao: "acaso pode sair coisa boa de Nazaré?" (Jo 1.46).

É provável que o leitor não saiba quem foram os bisavós de seus pais, e improvável que essas informações não estão em um livro guardado na gaveta. Mas os judeus, até por uma questão de obediência à instrução, levanta mais de três mil anos de história para responder Quem é? e de Onde vinha? Jesus de Nazaré.

Mateus, em sua genealogia já responde logo no início a origem de Jesus. É como se toda a genealogia (Mt 1.1-17) fosse o título de todo o livro, até porque antecede à descrição do próprio nascimento.

Já Lucas, prefere colocar a genealogia quando as questões começaram a aparecer por volta do início do ministério público de Jesus, já tinha 30 anos e logo após seu batismo nas águas quando se ouviu a voz: "Tu és o meu Filho amado; em ti me agrado" (Lc 3.22) é que Lucas procurando responder com ênfases diferentes às de Mateus, "de onde" Jesus vinha.

Em Mateus os dois primeiros nomes são suficientes para compreendermos "de onde" vem ou vinha Jesus: Abraão e Davi

<p>A promessa começa depois da dispersão dos povos na confusão da Torre de Babel, e Abraão é o escolhido a apontar para o futuro, a ser peregrino e a caminhar por uma estrada que só acabaria no futuro: "esperava a cidade que tem fundamentos, cujo arquiteto e construtor é o próprio Deus" (Heb 11, 10). Primeiro alcançaria seu descendente (Jesus) e dali todas as nações (Gn 18.18), assim, a universalidade da missão de Jesus está incluída neste "de onde" ele vem.

Mateus parece consolidar pela estrutura narrada e amarrada mais pela promessa e pessoa de Davi, a quem fora feita a promessa de um reino eterno: "O teu trono se estabelecerá para sempre" (2Sm 7.16). Digo isso pelo cuidado que ele teve em destacar a divisão de três grupos de 14 gerações: 1º subindo de Abraão até Davi, 2º descendo de Salomão até o exílio da Babilônia, 3º subindo de novo até Jesus, em quem a promessa alcança a sua realização. Isso considerando que as letras do nome "Davi" somam 14 conforme numeração judaica, fato este de fácil percepção para os judeus - assim, aparece o rei que permanecerá para sempre, mas completamente diferente daquilo que se poderia imaginar com base no modelo de Davi.

<p>Outro aspecto curioso na genealogia de Mateus, antes que chegue a Maria (onde termina), são mencionadas quatro mulheres: Tamar, Raab, Rute e "a mulher de Urias". O que levaria Mateus notificar tais mulheres das quais qualquer judeu teria dito: "São pecadoras". Podemos então dizer por subjacência a indicação de que os ombros de Jesus já carregava os pecados e com estes, todos os pecados do mundo. Mas não se atenha. Essa não pode ter sido a motivação de Mateus, penso eu. Porém, mais notório do que isto, é o fato de nenhuma delas serem judia - isso me parece mais lógico uma vez que, delas, sabemos que o mundo dos gentios fizeram presença na história para a plenitude dos tempos e a manifestação visível do Deus invisível (Col 1.15) - Deus o quis assim. Além do mais, tira de qualquer judeu, a pretensa idéia de que os gentios não poderiam ser alcançados por uma salvação provida por um Deus que se manifestou sem a sua cumplicidade no processo natural. Isso torna-se visível que a missão de Jesus se destinava a judeus e pagãos.

Fato admirável é a quebra do paradoxo - pense comigo: "Abraão gerou Isaque...", assim, os homens vão gerando uns aos outros até que José se estanca a geração e apenas diz: "Jacó gerou José, o esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, chamado Cristo" (Mt 1.16). Assim, Mateus tem o cuidado de dizer que José não era pai de Jesus: **“O que nela foi gerado vem do Espírito Santo” (Mt 1, 20). Isso não era novo para um estudante cuidadoso, pois no próprio livro de Gênesis quando o Criador profetizou a vinda de Jesus, ele disse: "A semente da mulher pisará na cabeça da serpente" (Gn 3.15) - ora, mulher não tem semente e sim o homem. Como poderia ser isto? Agora, esclarecido em Mateus, quando se diz que a "semente" não veio do homem e sim do Espírito Santo. ** Jesus é um novo começo, em um novo Éden, portanto, sendo o segundo e último Adão.

Mas José não perde sua importância, pois juridicamente é o pai de Jesus e por meio dele e segundo a Lei, "legalmente" pertence à tribo de Davi. Todavia, Jesus tinha vindo do alto e essa dupla origem respondia concretamente a pergunta: "De onde Ele (Jesu) vem?"

Voltando para Lucas (Lc 3.23-38), numa ótica de um gentio que era, podemos observar destaques distintos se comparada com a mostrada por Mateus.

Já dissemos que Lucas apresenta a genealogia quando Jesus já era uma figura pública ao passo que Mateus a antecede ao nascimento procurando sempre responder "de onde" Jesus era no seu duplo sentido.

Outro fato surpreendente é que nem todos os nomes batem, deixando claro que as fontes usadas poderiam ser distintas, uma vez que enquanto Mateus segue a linhagem de José, Lucas segue a linhagem de Maria e por ambas linhagens Jesus descende de Davi. Mesmo assim, fica claro para ambos (Mateus e Lucas), que o importante não eram os nomes individuais, mas sim a estrutura simbólica de como o nome de Jesus se encaixava perfeitamente na história da promessa de um novo início

Outra distinção em Lucas é que ele faz a narração descendo. Lembra que Mateus pega do homem da promessa (Abraão) trazendo da raíz até Jesus, mas a narração Lucana desce de Jesus até a sua raíz, mas não a raíz que permanece enterrada no chão, mas estabelecida eternamente no “alto", em Deus que está na origem do ser humano: “...Enós [era filho] de Set, [filho] de Adão, [filho] de Deus” (Lc 3, 38). Entretanto, assim como Mateus, Lucas também atribui a legalidade de filiação a José (Lc 3.23). Enquanto Mateus estrutura a genealogia de forma teológica/simbólica em seus 3 grupos de 14 gerações, Lucas cita espontaneamente 76 nomes aparentemente sem nenhuma intenção simbólica, mas que talvez "acidentalmente" pode ainda ser encontrada pelos caçadores de enigmas: Lucas apresenta na genealogia 11 vezes sete elementos apontando para a divisão apocalíptica que divide a história universal em 12 períodos: Sendo assim, há aqui uma alusão discreta de que chegou a "plenitude dos tempos", pois até chegar em jesus, desde Adão (como narra Lucas), houve 11 períodos de 7 gerações e Jesus completaria a décima segunda geração da revelação completando os tempos determinados por Deus. Jesus é o novo Adão, que também veio de Deus trazendo Sua imagem, mais radical que o primeiro. Por isso Lucas remonta até Adão. Lucas, mesmo não sendo judeu, já sabia suficiente para motivar sua genealogia na premissa de que Jesus assume em Si a humanidade inteira para dar-lhe novo caminho.

O evangelista João, conciso em suas respostas, vai mais afinco, apesar de não apresentar uma genealogia natural como os demais, mas que ao ampliar a respostas, introduz seu livro explicitamente respondendo "de onde" Jesus veio e "quem" era Ele: “No principio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. (...) E o Verbo Se fez carne, e armou a sua tenda no meio de nós” (1.1-14). Com este texto, João cria sua verdadeira genealogia. Aqui neste texto, é que encontramos o Jesus histórico como uma tenda armada para habitação do Verbo, ou a Tenda da Reunião pré-figurada no Tabernáculo e depois no Templo. Se as genealogia foram citadas para responder "de onde e quem" era Jesus, João responde que Ele era o Princípio: a causa primeira e de onde provém a luz - Jesus vem de Deus - Ele é Deus.

É assim que João dá a interpretação profunda de todas as genealogias, nos mostrando que por meio da fé podemos entrar para esse nova criação (Jo 1.12,13).

Assim como a genealogia de Jesus é interrompida em José para que o Espírito Santo pudesse gerar no ventre de Maria o seu salvador, a nossa também deve ser interrompida através da fé para que Jesus seja gerado em nós.

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Mt 1.1 "...filho de Davi, filho de Abraão" Já nas primeiras letras de seu Evangelho, Mateus começa a desenvolver o tema de seu escrito: "O Evangelho do Reino": Jesus, sendo filho de Davi, possui as credenciais necessárias para ser o rei de Israel. Esse reinado terreno, esperado pelos judeus e prometido por Deus na pessoa do Messias ainda será efetivado no milênio. Antes disso, Jesus haveria de estabelecer um outro tipo de reinado: O reino dos céus para o espírito do homem só possível através da fé ensinada por Abraão. <p>A sequencia narrada é ao contrário da sequencia cronológica, ou seja, antes de ser filho de Davi (para estabelecer o reinado terreno), Jesus era também o filho de Abraão "pai dos que creem" (Rm 4.11), e deveria estabelecer primariamente o reino dos céus. O trocadilho pressupõe que a fé ou o reino dos céus (reinado espiritual), manifesta antes do reinado terreno, assim como Abraão vem antes de Davi.

<p>Todo judeu ao saber a origem de Jesus, tinha motivos claros para recebe-lo como sendo o Messias Davídico, portanto habilitado para n'Ele se cumprisse as promessas dada ao rei Davi (2Sm 7.16), bem como o único capaz de cumprir as alianças feitas com Abraão (Gn 12.2 em diante e Gn 18.18).

<p>Mateus tem a perspicácia de ir desenvolvendo esse ensinamento até desvenda-lo totalmente nas últimas palavras do livro (Mt 28.18-20). Assim, Mateus trabalha a herança e a esperança de Israel que deveria ser replicada até aos confins da terra.